O ex-governador do estado de Mato Grosso do Sul André Puccinelli (PMDB), o ex-secretário de Fazenda Jader Rieffe, e o ex-secretário de Saúde Antônio Lastória estão sendo investigados por improbidade administrativa por não aplicarem o mínimo constitucional em ações e serviços públicos de saúde. A ação foi ajuizada pelo Ministério Público Federal (MPF) em Mato Grosso do Sul.
Segundo dados do MPF, R$ R$ 374.477.586,31 deixaram de ser investidos no setor em 2013. De acordo com a Constituição Federal e a Lei Complementar 141/2012, pelo menos 12% da receita líquida dos impostos estaduais e de receitas de repasses obrigatórios devem ser aplicados na saúde pública.
Análise do corpo técnico do Tribunal de Contas do Estado (TCE/MS) concluiu que, em 2013, apenas 51,1% do montante devido foi efetivamente transferido ao Fundo Estadual de Saúde, conforme determina a lei. A situação fere a legalidade e a moralidade da administração pública e configura ato de improbidade administrativa.
O MPF considera que a irregularidade viola o direito à saúde dos sul-mato-grossenses e pede a condenação dos ex-gestores ao pagamento de indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 10 milhões, fora as penalidades previstas na Lei de Improbidade Administrativa. A reparação deverá ser revertida ao fundo de saúde do estado.
Argumentos rebatidos
Em julho de 2015, o MPF ajuizou outra ação para obrigar o Estado de Mato Grosso do Sul a aplicar na saúde o valor não investido em 2013. Em resposta, o Estado alegou que as contas de 2013 foram aprovadas pelo TCE/MS, não cabendo contestação.
O MPF, entretanto, rebate o argumento. “O julgamento pela corte de contas em nada afeta a apreciação judicial da demanda, as instâncias administrativa e judicial são independentes. A análise técnica realizada pelo corpo técnico especializado do TCE/MS é objetiva e é com base nesses dados que se baseia a ação”.
Também foi invocada pelo Estado a Lei do Rateio – que permite considerar gastos gerais da administração como se fossem em saúde – para justificar a falha. O argumento foi aceito pelo TCE, mas é criticado pelo MPF na ação, que considera a decisão do tribunal contraditória. “Ao mesmo tempo em que o Tribunal de Contas reconhece a legitimidade da incidência da Lei do Rateio para contabilizar gastos estranhos à saúde como 'ações e serviços públicos de saúde', recomenda que nos anos posteriores seja observada na integralidade a LC 141/12! Ora, ou a Lei do Rateio pode ser considerada para o referido fim ou não pode! Por que ela poderia ser considerada em 2013 (quando já em plena vigência a LC 141/12) e não mais em 2014, 2015 e anos posteriores?”, defende o MPF..
Contas não batem
No Balanço Geral das contas do Estado, o governo afirma ter aplicado R$ 738.472.798,41 em ações de saúde. Contudo, se considerada apenas a contabilidade oficial, nem sequer o mínimo constitucional foi atingido – há um déficit de mais de R$ 27 milhões. O valor oficialmente declarado pelo Governo do Estado ainda incluiu recursos oriundos de outras fontes (como transferências da União), que somam R$ 199.718.000,00 – o que é proibido por lei.
“Na melhor das hipóteses, o estado deixou de investir R$ 27.577.508,53 na saúde pública, montante já considerável. Se analisarmos que nem todo o valor declarado foi de recursos próprios, subimos para um prejuízo de R$ 227.295.499,53. Contudo, para cumprir a lei, todos os recursos do mínimo constitucional deveriam ter sido transferidos para o Fundo Estadual de Saúde – uma forma de dar transparência aos gastos públicos e de fazer com que os rendimentos do fundo sejam reaplicados na própria área da saúde. Neste contexto, o dano sobe para R$ 374.477.586,31, prejuízo visível à população sul-mato-grossense”, defende o MPF.
Além disso, a própria prestação de contas de 2013 se contradiz. No “Demonstrativo dos Recursos Destinados à Saúde – Despesa Empenhada”, o valor informado de investimento em saúde foi de R$ 797.804.631,45, não os R$ 738 milhões declarados no corpo do Balanço Geral. Esse mesmo dado inverídico, que inclui gastos oriundos da Lei do Rateio, foi lançado pelo então secretário de Estado de Saúde no SIOPS (Sistema de Informações sobre Orçamento Público em Saúde).
Pelas ilegalidades, os três acusados podem ser condenados a pagar danos morais coletivos, multa de até cem vezes o valor da remuneração recebida, além da suspensão dos direitos políticos por até cinco anos, proibição de contratar com o Poder Público ou receber incentivos fiscais ou creditícios pelo prazo de três anos.