O país vizinho é destino de muitos brasileiros para intervenções médicas com fins estéticos devido aos preços mais baixos e à fiscalização mais branda. O Paraguai não tem, por exemplo, uma organização dedicada à vigilância sanitária, como é o caso da Anvisa no Brasil, e mantém as atribuições sob guarda-chuva do Ministério da Saúde.
Até agora, foram identificados 11 casos no estado – seis confirmados para Mycobacterium abscessus, uma das micobactérias mais resistentes aos antibióticos conhecidas hoje, o que limita as opções de tratamento. Outros cinco estão em investigação. Entre os pacientes confirmados, três são brasileiro e três paraguaios, todos com o diagnóstico após procedimentos estéticos feitos no Paraguai.
De acordo com a secretaria de Saúde do Mato Grosso do Sul, as intervenções realizadas no país foram prótese de mama, abdominoplastia e lipoaspiração, e os brasileiros contaminados serão tratados em território nacional.
— A gente já teve um surto anterior relacionado à prótese mamária. Essa micobacteriose está relacionada principalmente a procedimentos estéticos porque ela fica nas próteses ou nos aparelhos utilizados em lipoaspiração, por exemplo. Então, se você não faz a esterilização adequada, você não consegue eliminar o microrganismo, e a gente tem casos de infecções hospitalares por não ter o controle sanitário adequado — explica o presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical (SBMT) Julio Croda, professor da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul.
A microbacteriose passou a ser monitorada pela Anvisa e departamentos de vigilância sanitária dos estados depois que, entre os anos de 2003 a 2008, ocorreram surtos distribuídos pelo país com mais de dois mil casos de infecção. A contaminação não acontece de pessoa para pessoa, e sim pelo uso de produtos e objetos infectados durante procedimentos médicos, especialmente os invasivos
Croda explica que, por se tratar de um microrganismo resistente aos medicamentos disponíveis hoje, o tratamento é mais difícil, mais caro e leva mais tempo, podendo chegar a meses.
— Os microrganismos resistentes são uma tendência, e uma muito preocupante, porque o tratamento é difícil e prolongado, e a gente no Brasil não está organizado para receber esse tipo de paciente — explica o presidente da SBMT.
Além disso, ele destaca que pode haver outros casos que não tenham sido notificados ainda, tanto no Paraguai, como de brasileiros que foram à fronteira para realizar o procedimento, mas ainda não tiveram o diagnóstico.
Procurados para saber quais medidas estão sendo tomadas para oferecer assistência aos pacientes e controlar o surto, a Secretaria de Saúde do Estado do Mato Grosso do Sul e o Ministério da Saúde não responderam até a publicação da reportagem.
Produtos mais baratos e com menos fiscalização
Além da viagem para realizar os procedimentos no Paraguai, há clínicas de estética brasileiras que importam produtos proibidos no Brasil, mas que são autorizados no país vizinho e vendidos por um preço mais baixo.
Em fevereiro deste ano, uma reportagem do programa “Fantástico”, da TV Globo, revelou que a polícia e a Vigilância Sanitária do Rio Grande do Sul investigavam uma clínica que estaria aplicando em clientes o produto Israderm, uma suposta toxina botulínica proibida no Brasil e cuja origem é desconhecida.
No Paraguai, no entanto, o Isradem é liberado, e a reportagem mostrou que comerciantes do produto dizem abertamente que enviam frascos pelo correio para o Brasil. Um cirurgião plástico de Foz do Iguaçu, no Paraná, contou ao programa que já cuidou de pacientes que tiveram complicações pelo uso do produto.
A gente já viu necroses de perdas do nariz e outras áreas da face devido esse tipo de complicação — disse o médico, que não teve o nome revelado.
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